Peça multimídia sobre Brigitte Bardot é uma preciosidade

Por fabiana seragusa

Quando você entra no pequeno auditório do Masp e vê aquele palco de cinco metros de comprimento nem imagina o quanto de coisa pode acontecer ali. Em “Com Amor, Brigitte”,
Bruna Thedy e André Corrêa interagem com projeções, cantam e dançam enquanto recriam
um momento peculiar da atriz francesa, que, durante uma viagem ao Rio de Janeiro em 1964,
fugiu do hotel onde estava para a casa de um amigo para tentar escapar do assédio da imprensa.

O caso é real, mas no espetáculo o tal amigo se transforma em camareiro. É nele que a artista confia para driblar produtores e jornalistas e ter instantes de paz. O texto inteligente de Franz Keppler instiga a reflexão sobre a invasão de intimidade, o sucesso desmedido e a solidão dos grandes astros, além de deixar claro o fascínio que os atores exercem no público.

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Muito criativa, a direção de Fabio Ock enche os olhos misturando teatro e cinema em um espaço diminuto. A plateia pode ver a mesma cena de ângulos diferentes, por exemplo, já que há câmeras que exibem ao vivo detalhes do palco —também são transmitidas imagens de várias câmeras de segurança tanto de dentro do teatro quanto da parte de fora. Tem arte de todos os lados.

“Eu já tinha a ideia das câmeras, pela questão da invasão de privacidade, mas o resto foi surgindo naturalmente”, diz Ock. “Queria que o público saísse com uma sensação intensa, acho que por
isso acabou tendo tudo isso.” A mescla de elementos deixa mais intensa a relação entre dois mundos tão diferentes: o glamour de Brigitte, ícone da beleza e sensualidade, e a simplicidade do camareiro, Álvaro. A peça segue até 26/6, com sessões aos fins de semana e ingressos a R$ 50.

Masp – Pequeno Auditório – av. Paulista, 1.578, Bela Vista, centro, tel. 3149-5959. Até 26/6. 80 min. 14 anos. 80 lugares Ingr.: R$ 50. Compre on-line pelo ingressorapido.com.br.

 

BRUNA THEDY

“Acho que quando as pessoas entram ali naquela sala pequena e veem aquele palco
num espaço cênico de um triângulo, praticamente, não imaginam no que tudo aquilo vai se transformar. Tenho a sensação que a encenação dessa peça tem um dos poderes mais lindos do teatro, que é fazer você esquecer onde você está. É tanta coisa ali, orquestrada de uma maneira simples e criativa, que no fim as pessoas vêm falar: ‘Nossa, parece que eu estava num outro lugar. Não parece a mesma sala do começo'”

“Meu momento preferido da peça é toda a passagem sobre velhice, que se encerra em uma
cena de máscara. Naquele momento passa um filme na minha cabeça, me misturo com a Brigitte. Penso no quanto deve ter sido difícil pra ela essa transição. Penso na pressão. Na decadência. Apesar de a peça falar sobre invasão de privacidade, pra mim, esse momento define o espetáculo. Consigo olhar bem nos olhos do público e percebo o quanto as pessoas se chocam, se emocionam e se identificam com a dualidade de ser jovem e envelhecer. Essa foi uma questão crucial na vida dela. Ela cansou de ser bonita, isso é muito forte.”

“Optamos, já que a peça não é uma biografia, por criar a nossa Brigitte. Não existe
um compromisso de eu ser exatamente como ela, mas sim de retratar o espírito dessa mulher. Lados que todos conhecem e outros mais obscuros. Minha busca nos ensaios foi encontrar a mistura de ser leve e solar, mas ter monstros poderosos nas profundezas. E, por meio disso, me alimentar da energia dela.”

ANDRÉ CORRÊA
 “A peça trata de uma questão que é a invasão de privacidade na sua origem. A Brigitte talvez tenha sido uma das primeiras pessoas a passar por essa devassa na vida pessoal por causa da mídia. E mostrando o que isso pode gerar de problema para a pessoa e a influência no cotidiano dela e em sua relação com o mundo. Muitas vezes trazendo uma solidão e um isolamento muito grande.””E tem uma ligação muito grande com o dia de hoje. Muita gente quer ser celebridade
instantânea, às vezes até uma celebridade não ligada a um oficio, a um trabalho. Essa coisa da internet, de ficar todo mundo expondo sua vida em fotos e se autopromovendo. Então a peça aparece como uma crítica a esse comportamento. Eu acho isso muito pertinente para as pessoas pararem um pouco para pensar no significado do que é esse tipo de situação e se elas realmente precisam disso na vida, né.”

“A gente tem uma maneira muito criativa e muito pouco usual de contar a história. Tem um diálogo muito grande entre teatro com cinema, tem várias projeções, câmeras de segurança fazendo uma cobertura de imagens do espetáculo o tempo todo em vários ângulos diferentes.
É uma experiencia bem particular, interessante e nova para o público, até porque a maneira como a gente coloca isso no teatro faz com que o espectador tenha que ser muito ativo. Uma coisa acontece de um lado, outra coisa de outro. São efeitos bem interessantes.”

“A questão da música é outra coisa muito importante. Eu até brinco com o Ock [diretor] que até que enfim alguém me deu um espetáculo onde eu possa cantar e tocar. Porque quando eu era moleque eu tinha banda de rock, minha adolescência foi nos anos 80. Eu faço teatro há muito tempo, mas nunca tinha rolado nem de tocar e muito menos de cantar —e nessa ele já me colocou cantando em francês. Eu adoro. Isso traz uma cara moderna pro espetáculo. Ele é dramático mas ao mesmo tempo é performático e épico. Isso também é um charme da peça.”